Panóptico

sábado, 13 de fevereiro de 2010

RAFAELA


"Sainte-Thérèse comme philosophe" by Félicien Rops (1833- 1898)


Rafaela me diz
que veio do sertão de Alagoas
atravessou o Rio São Francisco
na carroceria de um mercedes-benz
agora, ela está amaciando
os membros grotescos
dos senhores da moral
nos cabarés e mercados do Centro.


17 anos e um olhar de puta inocente
coração de moleca espevitada
acariciando a pedra bruta
desses dias tão polidamente bárbaros
e de palavras que não colam
no Porto Dantas de Rafaela.


Ela me diz que foi abandonada por Cristo
e suspeita que ele não é o que dizem
que a sociedade é feita de animais cínicos
sob a máscara de educados artifícios:
“minha única saída, ela diz
é endurecer o corpo e abrir as pernas
prum mundo sem amor”.


Ah, pode acreditar, minha santíssima puta
vou endurecer junto com você
num mundo de parabólicas e vitrines coloridas
onde socialites vaidosas e sem-cérebros
berram em pastos sempre verdes
babando as pencas de cajus,
e uruburgueses porcolíticos franqueados
chapados de whisky, cifrões e retóricas
na moderna província de Aracaju.

                                                                                           (Pirro)






2 comentários:

Camila Pequena disse...

UAU!!!

Texto absolutamente perfeito!

Gostaria de ter conhecido Rafaela...

Camila Pequena

Nabuco disse...

Puts véio, excelente! Poesia é isso. Não se comenta. Tudo o que se disser...é bobagem. Se lê e se guarda no cérebro e no computador para seguidas releituras até que o miolo cinza (nossa alma) fique tatuado com o escrito.